Justiça autoriza inclusão de multa por traição em pacto antenupcial

Embora pareça estranha, é legítima a pretensão de um casal de fixar multa para o caso de infidelidade em um pacto antenupcial. O Código Civil Brasileiro já prevê o dever de fidelidade, e a cláusula penal serve, nesse contexto, para reforçar o cumprimento do dever.

Além disso, o poder público deve exercer a mínima interferência possível na esfera privada. Assim, o pacto antenupcial, como fruto da deliberação conjunta do casal e da autonomia privada, serve para que eles escolham termos que melhor se adequem à vida que escolheram levar a dois.

Com essa justificativa, a juíza Maria Luiza de Andrade Rangel Pires, da Vara de Registros Públicos da Comarca de Belo Horizonte, julgou improcedente a dúvida suscitada por uma tabeliã do cartório de registro Civil e Notas na capital mineira e autorizou a lavratura de um pacto antenupcial com cláusula penal que estabelece multa de R$ 180 mil em caso de eventual traição de qualquer uma das partes.

A juíza destacou, ainda, que o acordo é um negócio jurídico, que não impede que sejam previstas regras extrapatrimoniais, desde que não sejam contrárias à legislação brasileira.

De acordo com os autos, uma oficial do cartório havia levantado “dúvida registral” a respeito de um requerimento do casal durante o procedimento de habilitação de casamento com opção pelo regime de separação de bens.
A tabeliã rejeitou parte do conteúdo do pacto antenupcial por considerar que esse instrumento “deve se restringir a tratar do regime de bens entre os cônjuges”. O casal, inconformado, recorreu à Justiça.

Em sua sentença, a juíza deixa claro que a exigência do casal não contraria as leis brasileiras, já que o dever de fidelidade mútua também é previsto no Código Civil Brasileiro — artigo 1.566, inciso I. Segundo ela, a multa como punição somente reforçaria o cumprimento desse dever.

“A questão da possibilidade de tal inclusão é bastante controvertida e tem suscitado discussões no meio doutrinário, parecendo-me mais adequada, a par dos substanciosos argumentos apresentados pela zelosa Tabeliã, a posição daqueles que a admitem. É que o pacto possui natureza de negócio jurídico, de modo que, embora seu conteúdo primordial seja mesmo patrimonial, acerca do regime de bens adotado pelo casal, nada obsta que possam os nubentes também, no referido instrumento, estabelecer ajustes extrapatrimoniais, desde que não contrários à legislação brasileira”, sustentou a juíza Maria Luiza em sua decisão.

O pacto antenupcial nos moldes pretendidos pelo casal, explica a magistrada, deve observar as balizas impostas pelo artigo 104 do Código Civil, quais sejam, a de ter partes capazes, objeto lícito e forma legal.

Para sustentar tal decisão, ela cita Maria Berenice Dias, autora do Manual de Direito das Famílias, que aponta a inexistência de impedimento para que as pessoas que vão se casar determinem, também, questões de natureza não patrimonial, uma vez que o exercício da autonomia privada das partes encontraria limitação apenas na lei.

Ainda a corroborar essa posição, há o Enunciado 635 da VIII Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal: “O pacto antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar.”

O Ministério Público havia se manifestado apenas pelo regular prosseguimento do feito.

 

Fonte: Conjur

Imagem: Image by Freepik

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